BONITINHA, MAS ORDINÁRIA (1968)

A peça “Bonitinha, Mas Ordinária”, uma obra teatral de Nelson Rodrigues, foi submetida a sucessivas análises pela Censura Federal, resultando em uma classificação etária para maiores de 18 anos. Desde o início, os censores avaliaram que a peça continha linguagem explícita e abordava temas sensíveis e controversos, como violência, moralidade e desespero social. Tais elementos foram considerados inadequados para audiências mais jovens, levando à imposição de restrições e cortes em partes específicas do texto.

No primeiro parecer, os censores realizaram uma avaliação inicial do conteúdo, destacando a linguagem crua e direta empregada na obra. Para as autoridades, os diálogos exploram situações de forma explícita e impactante, incluindo temas como violência, desespero humano e a exposição de comportamentos considerados socialmente inaceitáveis. Essa abordagem foi interpretada como potencialmente influenciadora do público mais vulnerável, o que motivou a recomendação de restrição etária. A censura alegou que a peça poderia normalizar comportamentos moralmente questionáveis, especialmente em sua representação de personagens complexos e suas ações extremas.

No segundo parecer, a análise tornou-se mais específica, enfocando o uso de linguagem considerada vulgar e as implicações dos temas ofensivos abordados. Os censores demonstraram preocupação com o impacto da peça ao tratar de forma direta violência e problemas morais sem, em sua avaliação, oferecer um contraponto crítico que suavizasse o impacto do conteúdo. Essa percepção resultou em recomendações de cortes em diálogos e cenas específicas, visando mitigar trechos considerados mais perturbadores ou ofensivos à moralidade pública.

No terceiro parecer, após a análise das sugestões de cortes e adaptações, a censura reiterou a classificação etária para maiores de 18 anos, destacando que, mesmo com as alterações, a essência da obra permanecia problemática para o público jovem. A peça foi vista como uma crítica contundente à sociedade, oferecendo uma visão pessimista e fatalista do comportamento humano e da moralidade, elementos que colidiam diretamente com os valores tradicionais defendidos pelo regime.

Por fim, no parecer final, a decisão de restrição etária foi confirmada, com base nos critérios de moralidade pública e no impacto potencial da narrativa sobre o público. A censura argumentou que a peça, ao retratar com realismo e intensidade temas como violência, desespero social e contradições morais, exigia do espectador um nível de maturidade crítica para compreender a obra em sua totalidade. Mesmo com cortes e modificações, a censura avaliou que a mensagem central de “Bonitinha, Mas Ordinária” poderia ser mal interpretada por audiências mais jovens, justificando a manutenção das restrições.

O processo de censura de “Bonitinha, Mas Ordinária” evidencia o conflito entre a expressão artística e o controle ideológico durante o regime militar brasileiro. A peça, ao explorar de forma direta e visceral as falhas morais da sociedade e os dilemas humanos, desafiava o ideal de moralidade e ordem promovido pelo governo.

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