O REI DA VELA (1967)

Em 1967, a peça “O Rei da Vela”, de Oswald de Andrade, foi submetida ao Serviço de Censura Federal devido à sua natureza satírica e ao seu potencial de criticar a sociedade brasileira e as autoridades. Desde a primeira análise, a censura classificou a obra como imprópria para menores de 18 anos, destacando que algumas falas continham expressões subversivas e abordagens críticas a temas sensíveis, como capitalismo, exploração e corrupção. O tom irônico e provocativo da peça foi interpretado como um estímulo ao público para questionar o sistema vigente.

Os censores solicitaram a remoção ou reescrita de diversas cenas e diálogos, especialmente aqueles que tratavam do abuso de poder, desigualdades sociais e a ganância dos empresários. Esses trechos foram considerados delicados por expor figuras de autoridade como corruptas e explorar críticas diretas ao sistema econômico brasileiro. Para a censura, essas modificações eram essenciais para que a peça pudesse ser liberada, ainda que com restrição ao público adulto. A preocupação central era conter qualquer conteúdo que pudesse ser interpretado como um ataque aos valores morais e sociais defendidos pelo regime.

A peça passou por revisões subsequentes em 1970 e 1978, durante as quais novas modificações foram exigidas para adequá-la às normas estabelecidas. Cada revisão reafirmava a necessidade de supervisão contínua das apresentações, com os censores mantendo vigilância para evitar o retorno de trechos considerados inadequados. Em cada etapa, a censura buscava suavizar o impacto do texto, eliminando referências explícitas a figuras públicas ou críticas diretas à política e ao sistema econômico. A peça, com seu tom crítico e irreverente, continuava a ser vista como uma produção que desafiava os valores conservadores e as estruturas de poder.

Em 1980, após múltiplas revisões e edições, foi emitido um certificado final com a restrição permanente para menores de 18 anos. A aprovação definitiva veio acompanhada de instruções rigorosas para que a peça fosse exibida somente com o texto revisado e carimbado, garantindo que as modificações exigidas permanecessem em vigor. As adequações finais incluíram a moderação da linguagem e a remoção de críticas diretas a figuras públicas, além da exclusão de cenas consideradas excessivamente provocativas.

No primeiro parecer, a censura já havia identificado que “O Rei da Vela” apresentava uma visão contundente e crítica da sociedade brasileira. A peça retrata o capitalismo como um sistema opressor e expõe as contradições sociais por meio de personagens caricaturados, como empresários gananciosos e exploradores. O censor destacou que, embora situada em um contexto histórico, a narrativa possui alusões ao presente, com um tom irônico que poderia incitar o público a refletir criticamente sobre as estruturas políticas e econômicas da época.

A linguagem utilizada por Oswald de Andrade foi apontada como provocadora e desafiadora, especialmente em falas que abordam a corrupção e a exploração dos trabalhadores. A crítica às figuras de poder e à ética dos líderes foi considerada uma ameaça à ordem social, justificando a imposição de cortes e restrições. A censura argumentou que o tom cômico e satírico da obra poderia levar a uma interpretação distorcida dos valores morais tradicionais, especialmente entre os espectadores mais jovens, reforçando a necessidade de limitar o acesso ao público adulto.

Por fim, a censura concluiu que “O Rei da Vela” poderia ser exibida sob condições estritas, com a remoção ou modificação das partes mais incisivas e a supervisão constante para assegurar o cumprimento das normas estabelecidas.

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